quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Silêncio e Fé

silêncio incomoda. Por mais paradoxal que pareça. Sim, o silêncio constrange, perturba, inquieta e nos desafia a quebrá-lo. Vivemos em meio a um burburinho. Sirenes, motores, vozes e caixas sonoras com potências desconhecidas pelo decibelímetro. Arrisco dizer que isso é só uma projeção dos barulhos internos que povoam a alma de cada um de nós. Num jogo de futebol, um minuto de silêncio, é apenas vinte ou trinta segundos. Num culto, a oração silenciosa de alguns minutos, torna-se, para muitos de nós, uma eternidade. Em casa, o vozear da televisão ou do rádio, desfaz o medo da solidão e do silêncio.

Para nós crentes, há um silêncio ainda mais perturbador. O silêncio divino. Deus, às vezes, também silencia e o céu se cala. Eu, possivelmente como você, já vivi a experiência do silêncio divino. Davi também: "Deus meu clamo de dia, e não me respondes; também de noite, porém não tenho sossego" (Sl. 22:2). A oração mais comum em tempos de quietude celestial é: "Ó Deus não te cales; não te emudeças..." (Sl. 83:1).

Já orei por uma série de coisas que não aconteceram. Minha primeira experiência foi logo no início da minha vida cristã, quando orei por uma mulher seriamente enferma, não me lembro seu nome, mas me recordo que horas depois recebi a notícia de seu falecimento. Foi minha primeira séria crise com o silêncio divino, talvez com a audição divina. Afinal, antes de pensar que Deus não me respondera, inferi que Ele não me ouvira. Mas logo, sobrenaturalmente, minha dúvida quanto a suposta surdez de Deus se dissipou. Então, eu sabia que Deus havia me ouvido, mas ainda não entendia, porque não havia me respondido.

Quando pastor em Goiânia, experimentei um pouco do drama de uma família que perdeu um filho de cinco ou seis anos, vítima de leucemia. O casal, recém chegados ao Evangelho, vieram de uma cidade do interior goiano para o tratamento da criança na capital. Deixaram sua casa e trabalho no interior e, fixaram residência em Goiânia, esperando um milagre. Ainda me lembro e choro, ao recordar do Tiaguinho, um menino que a priori parecia não ter nenhum problema aparente, e dos pais que o traziam à igreja, e das vezes que no culto dominical oramos para que Deus o curasse. Visitei-o várias vezes no Hospital Araújo Jorge. E confesso que nos últimos dias de sua breve vida, quando os médicos o liberaram pra que ficasse em casa, temi visitá-lo, sensível ao quadro de dor e gemidos da criança e ao desespero dos pais.

Foi em meio às circunstâncias e experiências desse tipo que o conceito de fé se tornou mais nítido pra mim. Compreendi o significado da crise de Habacuque diante do silêncio divino: "Até quando, Senhor, clamarei eu, e tu não me escutarás?" (Hc. 1.2), e da resposta de Deus conclamando o homem à fé: "... mas o justo viverá pela sua fé." (2:4). Teceu-se diante de mim o conceito de que fé é muito mais do que poder operador de milagres, é antes descanso num Deus soberano e bondoso. Caio Fábio disse certa vez que "ter fé, quando não há milagres, é um milagre maior do que ter fé para operar milagres". Portanto, a fé que agrada a Deus é muita mais do que o poder que opera o impossível, mas a convicção, que diante do soberano silêncio de Deus, não arrefece nem se amargura.

Já me impressionei muito com testemunhos de milagres, eles ainda me comovem. Mas nada me fortalece mais do que ver crentes que, mesmo diante do silêncio, dores ou tragédias; continuam a confessar:

"Ainda que a figueira não floresça, nem haja fruto na vide; o produto da oliveira minta, e os campos não produzam mantimento; as ovelhas sejam arrebatadas do aprisco, e nos currais não haja gado, todavia, eu me alegro no Senhor, exulto no Deus da minha salvação." (Hc. 3: 17-18)

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